segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Relatos Cirúrgicos - Parte IV

Naquela noite eu dormi um pouco melhor, mas minhas costas doíam muito. Frequentemente me mexia, e frequentemente chamava a equipe de plantão para me arrumar na cama, chorar um pouco, reclamar, pedir medicação. Foi num desses momentos, então, que a equipe - já sem paciência, ao me arrumar na cama, deslocou o meu dreno. Surtei. E logo adormeci. Já não tinha mais esperanças. E acordei com cheiro de xixi d- porque a equipe não se prestou nem para esvaziar o recipiente da sonda...

Então, ao trocar de plantão, fui presenteada com a melhor equipe daquele hospital. Tive o atendimento e respeito que merecia (e precisava). Até consegui rir. E me deram café. E, se no dia anterior o banho de leito durou 5 minutos, neste durou 40!!! Como foi maravilhoso me sentir limpa, cheirosa... digna. Deixou meu dia menos pior...

Meu corpo ainda estava debilitado, mas tudo o que eu queria era sair dali o quanto antes. Os médicos não tinham certeza se me dariam alta naquele dia porque estava muito debilitada e, talvez, precisaria de transfusão de plaquetas. Mas resisti. Prometi a mim mesma que faria de tudo para sair dali aquele dia.

Na parte da tarde, então, a equipe me prometeu que se eu conseguisse andar, urinar sem a sonda e meus exames tivessem um pouco melhores, eles me dariam alta. Me agarrei a esses pontos e dizia pra mim mesma "De hoje não passa, você é capaz."

Tiraram a sonda, os drenos, fizeram curativo. Aliás, ganhei o título de melhor cicatrização daquele hospital, pois, em dois dias de cirurgia, os pontos estavam completamente secos, sem secreção alguma e as cascas já haviam soltado uns 70%. Os enfermeiros estavam completamente surpresos e nem foi preciso tampar o corte novamente.

A equipe de fisioterapia logo veio para me colocar de pé. Atontei no inicio, mas minha vontade de sair de lá era bem maior. Não desistiria tão facilmente. Em alguns minutos estava lá, caminhando, devagar, para lá e para cá, na UTI. Os médicos passavam e diziam "tu tá com vontade de sair daqui mesmo, heim? Não parou de caminhar ainda...". Eu só sorria. Me levaram ao banheiro, consegui, com muito esforço, urinar sem a sonda e, finalmente, tinha conseguido todos os pontos necessários para sair dali. Os exames não eram tão bons, mas a UTI, aquela altura do campeonato, já não era o melhor lugar para eu ficar.

Recebi alta. Fui para o quarto de cadeira de rodas, sendo guiada por um anjo maravilhoso. Lá estava minha família me aguardando. Finalmente era o começo do fim. 

Ou quase.

Na segunda-feira recebi visita dos melhores amigos que eu poderia ter. Palhaça que sou...lá estava fazendo todos rirem. Rir é o melhor remédio. Sempre.

Recebi outras visitas durante a semana, inclusive do meu chefe, na época, o qual serei eternamente grata por tudo o que tenho na minha vida. Sem ele, a esta altura, eu não poderia estar escrevendo esta série de relatos...

Mas então...

Lembram do dreno deslocado? Pois é! Como o deslocaram, meu corpo ainda estava com fluidos e...um dia antes de receber alta do hospital, os pontos se abriram e comecei a "vazar". Derrame pleural. Recebi alta mesmo assim, porém essa situação se arrastou por quase 30 dias.

Sobrevivi. Inclusive ao Estresse Pós-Traumático - eterna gratidão àqueles que me suportaram.

Apesar do excelente resultado obtido com essa cirurgia corretiva, é triste dizer que não foi o suficiente. Continuo indo anualmente ao meu maravilhoso cardiologista e a luta continua...já me preparando para uma 3ª cirurgia daqui uns bons anos....

Coisas da vida.